quarta-feira, 28 de abril de 2010



O livro do sapateiro

Surpreende O livro do sapateiro, que acaba de ser publicado, do poeta português Pedro Tamen. Adquiri-o por recomendação de Luis Patraquim, outro poeta. O autor escreve como se ele próprio fosse o sapateiro, ‘sentado no curto escabelo’, frente à janela, acompanhado “de quem não passa”. Ele que tem a pele da mão direita mordida pela vida, a dar uma “nova liberdade” a outras peles curtidas em serras e bosques. Faz pensar nos sapatos ou no boi de outro poeta, Mauro Mota. Mas, no caso de Pedro Tamen, o boi não é o objeto do poema, mas pretexto para valorizar a mão, o manual, manufatura ou artesania (palavra ausente de nosso dicionário, mas que prefiro a 'artesanato'). E quem não se recorda da artesania do ferrageiro de João Cabral? A mão, aliás, é palavra repetida à exaustão em quase todos os 49 poemas do livro. A desvalorização do ofício manual, ou daquilo que se supõe ‘vidas minúsculas’, tem nesse livro do poeta português uma resposta à altura, como a que lemos também nos romances de um Pierre Michon. “Acocorado como estava o escriba/ só não escrevendo...”, lê-se no livro. Para mim, uma das leituras mais interessantes dos últimos tempos.
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P.S.A ilustração de fundo é do artista plástico Hélio Jesuíno.
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